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  • Foto do escritorArthur Maresca

Na selva de pedra, um oásis de concreto


Quem nunca ouviu falar que São Paulo é um mar de concreto? Já subiu ao último andar do Altino Arantes ou ao Terraço Itália? Se já foi, então você sabe que o que vemos é mesmo um paliteiro de prédios. Na imensidão de prédios do chamado Centro Expandido, os espaços são bastante disputados e neste jogo de disputas observa-se na paisagem uma certa mediocridade arquitetônica, urbanística e ambiental: umas poucas praças abandonadas, muitos prédios padronizados e viadutos que sitiam a cidade. No oeste do tal mar de concreto tem uns galpões coloridos e vibrantes colados a dois prédios de concreto aparente com rampas e janelas com detalhes em vermelho livres e espontâneas. O prédio fabril na verdade é uma fábrica de sensações e de experiências singulares.

A arquitetura singular do Sesc Pompéia

Lina Bo Bardi legou um grande presente à cidade: O Sesc Pompéia. Aliás a arquiteta sugeriu um nome diferente ao local: Sesc Fábrica da Pompéia. Naquele momento o Sesc (Serviço Social do Comércio) dialogava fortemente com estudiosos da sociologia do lazer, dentre eles o sociólogo francês Joffre Dumazedier. Não se sabe muito bem até que ponto existiu o contato de Lina com as ideias sobre o lazer presentes naquele momento, mas dá para afirmar que ela tinha conhecimento sobre o tema. O nome sugerido por ela, Sesc Fábrica da Pompéia, é a prova cabal disso. Segundo a própria, este deveria ser o nome para que as pessoas fossem lembradas da dialética lazer-trabalho, de que lazer e trabalho são abstrações complementares: uma noção até hoje carente para uma cidade onde boa parte dos seus moradores vivem para trabalhar em funções que por vezes são tediosas após um longo e cansativo caminho pendular.

A arquiteta fez o que fez com maior dedicação e afinco que pôde. Teve um olhar bastante sensível tanto aos principais processos construtivos da fábrica quanto à formação do povo brasileiro. Carregou o espaço de alegria com cores vivas, pedras goiás e com entrada de iluminação natural nos galpões fabris. Esticou um deque-solário e pôs mesas e poltronas.

Criou com o charme do concreto aparente ambientes que fazem nossos olhos brilharem, mas nem de longe com ares de arrogância. Lina via no concreto uma poesia que se assemelha à humanidade: ele respira, tem imperfeições, é irregular. O concreto não precisa ser escondido por azulejos, texturização ou qualquer adereço, bom é ele desnudo mesmo. Não é o concreto escondido embaixo de mármores de edifícios suntuosos ou cheios de frufru. É o concreto racional e puro, livre de luxos, da mesma forma que o pau a pique é a solução do povo no sertão para ter onde morar. Seu objetivo é que pessoas de todas as classes sociais se sentissem à vontade ali, que se enxergassem naquela construção. Ela queria que as crianças brincassem livres por ali, que os trabalhadores pudessem aprender e ensinar seus conhecimentos, que os brasileiros vissem nas pedrinhas encravadas no chão a beleza da sua natureza.

É neste espaço que se forma um oásis de concreto no meio da selva de pedras: Na concretude de fora erguem-se prédios "chiques", padronizados e elitizados. Na concretude de dentro os trabalhadores brincam, relaxam, vão ao teatro ou comem um lanche por preços camaradas.

Nesta fábrica nós é que somos os donos.

 

Aproveito para agradecer pelos conhecimentos adquiridos no curso "A arquitetura moderna e popular de Lina Bo Bardi" ministrado por Renato Anelli e por Renata Bechara e auxiliados por Emily Fonseca. Também agradeço ao Centro de Pesquisa e Formação do Serviço Social do Comércio de São Paulo (CPF/SESC-SP) pela iniciativa bastante oportuna.

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